sábado, 2 de junho de 2012

"Insights" sobre a velhice a partir do debate promovido pela Senadora Marta Suplicy na PUC




Antes de iniciar essa postagem, quero ressaltar que esse Blog é sobre velhice e envelhecimento. Adoro velhos e adoro quem se interessa por essas questões, porque pensar em envelhecimento é pensar na sua avó, na sua mãe, em você, no seu filho e no seu neto. Nasceu, tá envelhecendo. Os cuidados para a manutenção da saúde e da aparência são muito abordados, por isso gosto de levantar aspectos que acredito que têm tanta importância como esses e que as pessoas evitam de falar ou pensar sobre eles. A velhice sempre é abordada com distanciamento, porque nunca nos incluímos na causa. Como constatou minha orientadora "velho é o outro" em qualquer idade. Velho é quem está pior que eu. E esse Blog é meu, né? De vez em quando vai aparecer um acesso de criatividade, uma brincadeira ou uma bobice qualquer, porque esse é meu jeito e eu sou assim. Isso não vou mudar, porque tem gente que não entende e não gosta. Eu não acesso Blogs que não gosto e também não meto o pau neles. Putz, o Blog é do cara e ele tem o direito de pensar e se expressar como bem entender. Essa liberdade deve ser respeitada, penso.  

Anteontem, na PUC, houve uma audiência pública promovida pela Senadora Marta Suplicy sobre um Projeto de Lei que visa regulamentar a Profissão do Cuidador do Idoso. Eu nunca a tinha visto pessoalmente e fiquei muito bem impressionada com sua postura diante do público que estava muito a fim mesmo de participar da discussão. Ela ouviu todas as pessoas que quiseram se pronunciar com o maior respeito. O projeto dela é muito bom e ela se mostrou disposta a revê-lo para que fique ainda melhor e viável para que se torne uma Lei. 

O que eu acho que cabe refletir aqui não é esse projeto, mas o significado social da velhice no Brasil e isso cabe a nós que estamos envelhecendo. O Brasil carrega uma identidade de beleza corporal e só isso é uma questão que dificulta a aceitação da velhice. Numa audiência pública fica claro como diversos tipos de segmentos da população, especialmente os ligados à velhice, veem essa questão. As pessoas que se  colocaram deixaram transparecer fortemente como a velhice é raciocinada como sinônimo de incapacidade e doença. A administração de medicamentos ao idoso foi o ponto que mais gerou polêmicas e discussões. Eu saí de lá pensando em muitas coisas que foram ditas e quero compartilhá-las aqui "no meu quadrado".

Há pessoas doentes que precisam de enfermeiros e há pessoas frágeis que necessitam de cuidados e atenção. Determinar que todo idoso é doente e necessita de alguém com a capacitação profissional de um enfermeiro é uma irrealidade. Da mesma forma que os recém nascidos e as parturientes necessitam de uma atenção mais direcionada às suas necessidades específicas, que podem assumir diversas configurações, assim são as questões transpostas para o caso do idoso. Cada caso é um caso e essa foi a dificuldade do diálogo na audiência: definir quem é o sujeito idoso para determinar qual é a função do cuidador. Acho que cabe ao contratante uma orientação para decidir que tipo de profissional necessita e pode pagar. Regulamentar essa profissão é importante demais, assim como acho que deveriam fazer a mesma coisa com as cuidadoras de "recém mamães" e "recém pessoas". O acompanhamento de um profissional que tenha um treinamento adequado para lidar com as especificidades desses momentos de vida é muitas vezes de importância fundamental.

Eu, particularmente, acho a vocação para a enfermagem, coisa de gente "meio anjo". Tive contato direto com enfermeiros que tiveram um papel determinante na recuperação de doenças muito complicadas, especialmente as que envolveram lesões cerebrais. Dei aulas de canto - isso mesmo - para pessoas que tiveram o cérebro baleado, por indicação de assistentes do famoso Nuno Cobra. Saia das sessões esgotada e muitas vezes me perguntei como os enfermeiros aguentam rotinas tão árduas, difíceis e conseguem estar sempre tão disponíveis aos pacientes. Quanta paciência e dedicação requer a enfermagem, quanto comprometimento e responsabilidade. Esses profissionais merecem uma remuneração condizente com suas funções e o reconhecimento da importância do seu trabalho. Compreendi melhor também, depois da audiência, as questões que envolvem o exercício da profissão de enfermagem. E eles estão certíssimos de se posicionarem. Não se pode confundir jamais o papel do cuidador e do enfermeiro.   

A velhice traz fragilidades, mas fragilidade não é necessariamente uma doença. E não pode virar. Nem a velhice, nem o nascimento podem ser tratados como doença, por serem o percurso natural da vida do ser humano. Há uma sabedoria do corpo para gerar uma vida, para sobreviver ao trauma do nascimento, para envelhecer e para morrer.  Precisamos acreditar que isso nos foi contemplado pela natureza. Muitas pessoas adoecem apenas por se darem conta de que estão velhas. Tem um filme lindo que se chama "A excêntrica família de Antônia" que mostra, dentre muitas realidades da vida, a morte de uma mulher que viveu conectada a essa sabedoria natural.  Indico muito. Tenho em DVD e o assisti várias vezes. Empresto para quem quiser, mas tem que se lembrar de me devolver, porque eu sempre me esqueço pra quem empresto minhas coisas. 

Quando o idoso se encontra incapacitado e necessita de atendimento médico constante, a família ou a instituição que cuida dele deverá saber que há a necessidade de um atendimento de enfermagem. Isso é uma questão de bom senso e esclarecimento. Se o idoso precisa de alguém que o lembre de tomar seu medicamento via oral nas horas certas, o ajude a se movimentar em algumas situações, o acompanhe nas atividades do dia a dia e lhe dê atenção, ele precisa de um cuidador. 

O velho está sendo estigmatizado como incapaz e mentalmente comprometido. (Ou então não é velho?)  Hoje são nossos pais e avós, amanhã seremos nós, se formos resistentes à vida e não morrermos antes de atingirmos a velhice. Já houve tempos em que respeitar os idosos era uma obrigação, suas opiniões e decisões eram acatadas, independentemente das condições que apresentassem e muitas vezes a contragosto dos familiares. Acho que o resgate desses valores é saudável e necessário, embora sei que me dirão que é utópico. Se a sociedade continuar definindo a velhice com tantos atributos pejorativos, logo logo ela se tornará algo insuportável e vai sobrar para nós. Quando o grupo social "sela" um conceito, todos acolhem seu significado e quem se recusa sofre pra burro. Por isso é importante construir um significado menos negativo para a velhice e isso cabe a todos nós que estamos envelhecendo. Eu não quero ser tratada como incapaz, doente e boba quando atingir a velhice, se Deus permitir, só por ser velha.

Em 2050 as estatísticas preveem um Brasil com 172 idosos para cada 100 jovens. Pode ser que em 2050 eu esteja viva com 88 anos. Quero estar num país que me proporcione boas condições de vida e isso já vai ser meio difícil, porque se isso acontecer, teremos com certeza, sérios problemas relacionados a assuntos previdenciários. Que bom que as políticas públicas querem tomar providências para melhorar a qualidade de vida dos velhos. Não podemos nos esquecer jamais que os políticos devem representar a nossa voz. E não podemos nos esquecer principalmente que não basta ter a voz, mas saber o que dizer.